Por que deixar grãos e sementes de molho antes de consumi-los?
Afinal, qual é a vantagem de se
deixar grãos e sementes de molho previamente? Deixar os grão de molho não
diminui seu valor nutritivo? Deixar grãos e sementes de molho não altera o seu
sabor?
São estas e muitas outras dúvidas que
surgem, e que eu espero sinceramente conseguir responder no texto a seguir.
A bem intensionada recomendação atual
para se consumir grãos integrais como faziam nossos ancestrais e farinhas de
grão integrais é, em parte, enganosa, e pode trazer sérias consequências para a
nossa saúde. Sim, nossos ancestrais consumiam grãos integrais, mas nem de
longe, da forma como consumimos atualmente. Nossos ancestrais, sabiamente,
deixavam de molho ou fermentavam seus grãos antes de consumi-los ou prepará-los
na forma de mingaus, pães, bolos, etc.
Um
rápido passeio pela culinária tradicional do mundo nos prova esta verdade: ma
Índia, o arroz e a lentilha são fermentados por pelo menos 2 dias antes de
serem preparados comoidli e dosas; na África os nativos
deixam a farinha de milho grossa deixada de molho durante a noite para depois
adicioná-la em sopas e caldos, e eles fermentam milho ou amaranto por vários
dias para então produzir um mingau azedo, conhecido por ogi; em
outras culturas o mesmo prato era preparado com aveias deixadas de molho; em
alguns países orientais e latino-americanos o arroz passa por uma longa
fermentação antes do seu preparo; a Etiópia tem seu tradicional pão injera,
preparado com o grão “teff”, que é fermentado por muitos dias; bolos de milho
mexicanos, conhecidos como pozol, são fermentados em folhas de
bananeira; antes da introdução dos fermentos comerciais, os europeus assavam
pães pesados, massudos, feitos a partir de fermentação natural; os pioneiros
norte-americanos eram famosos por seus pães de massa azeda, panquecas e
biscoitos. Talvez alguns senhores e senhoras de mais idade ainda se lembrem da
recomendação de deixar de molho, que vinha escrita nos pacotes de aveia
para mingau de antigamente…
Eu não sei bem de onde vinha esse
conhecimento ancestral de deixar grãos de molho ou fermentando antes de
consumi-los, mas é importante citar que estas práticas se adequam muito bem ao
que a ciência moderna sabe sobre os grãos.
Todos os grãos contém ácido fítico
(um ácido orgânico no qual o fósforo é ligado) em sua camada mais externa. O
ácido fítico pode-se ligar ao cálcio, magnésio, cobre, ferro e especialmente ao
zinco no trato intestinal e bloquear a sua absorção. É por isso que uma dieta
rica em grãos integrais não fermentados pode levar a sérias deficiências de
minerais e perdas ósseas. A moderna, mas incorreta recomendação para o consumo
de grandes quantidades de grãos integrais normalmente melhora o trânsito
intestinal num primeiro momento, mas pode levar a problemas como a síndrome do
intestino irritado, entre outros desagradáveis efeitos colaterais a médio e
longo prazo.
Deixar
de molho permite que enzimas, lactobacillus e outras substâncias quebrem e
neutralizem o ácido fítico. Um mínimo de 7 horas de molho em água morna e meio
ácido (conseguido com soro de iogurte ou gotinhas de limão) é
capaz de neutralizar uma grande parcela do ácido fítico contido nos grãos. A
simples prática de deixar grãos de molho por um período antes de consumi-los
irá aumentar enormemente seus benefícios nutricionais.
Deixar de molho em água morna também
irá neutralizar inibidores enzimáticos, presentes em todas as sementes, e
predispões a produção de numerosas enzimas benéficas. A ação dessas enzimas
também aumenta as quantidades de vitaminas disponíveis, especialmente as
vitaminas do complexo B.
CLIQUE
AQUI e veja imagens do feijão após cerca de 20 horas de
molho. É impressionante!
Os pesquisadores também aprenderam
que certas proteínas dos grãos, especialmente o glúten, são bastante difíceis
de digerir. Uma dieta rica em grãos integrais não fermentados, em particular os
grãos com alto teor de glúten como o trigo, sobrecarrega enormemente todo o
mecanismo digestivo. Quando este mecanismo digestivo “gasta” por causa da idade
avançada ou por excesso de uso, os resultados são observados na forma de
alergias, doença celíaca, doenças mentais, indigestão crônica e crescimento
descontrolado de candidas. Pesquisas recentes ligam a intolerância ao glúten
com esclerose múltipla. Durante o processo de molho ou fermentação, o glúten e
outras proteínas de difícil digestão são parcialmente quebradas em componentes
mais simples que são mais facilmente digeridos pelo nosso organismo.
Animais que se alimentam basicamente
de grãos e outras plantas, são animais que possuem pelo menos 4 estômagos! Seus
intestinos são mais longos, assim como o processo digestivo como um todo. O ser
humano, por outro lado, tem apenas um estômago e um trato digestivo bem menor
que o de animais herbívoros. O trato digestivo menor, também permite que
produtos animais sejam digeridos rápido o suficiente para não apodrecerem no
intestino, mas dificulta a digestão de grãos – a menos é claro, que se peça
ajuda às “bactérias boazinhas”. Elas agem no processo de molho ou fermentação a
que todos os grão deveriam ser submetidos antes do consumo.
Os
grãos são normalmente divididos eu duas categorias. Aqueles que contém glúten,
como aveia, cevada e especialmente o trigo não devem ser consumidos a não ser
que sejam previamente fermentados ou deixados de molho. Trigo sarraceno, arroz
e amaranto, por sua vez, não contém glúten e são mais fáceis de digerir. O
arroz integral e o amaranto contém menores doses de fitatos em comparação com
outros grãos, então se for para consumir algum grão sem deixar de previamente
de molho, que este grão seja o arroz integral ou o amaranto. Mas mesmo assim é
necessário cozinhá-los lentamente, em fogo baixo, e sempre utilizando um caldo caseiro à base de carnes e ossos (o
mocotó, tutano dos ossos, facilita a digestão desses grãos). Este cozimento
lento na presença do mocotó neutraliza alguns dos poucos fitatos e proporciona
uma boa dose de minerais ao prato. A panela de pressão jamais deveria ser utilizada. O
cozimento em panela de pressão é excessivamente
rápido, prejudicando a digestão.
A quinoa, original da América do Sul
é tida desde estudos antigos, como um bom estimulante da produção de leite
materno. Tecnicamente a quinoa não é um grão, mas sim um fruto da famíia
Chenopodium, e contém excelentes propriedades nutricionais. Qualquer produto à
base de quinoa deve ser sempre deixado de molho previamente. Os antinutrientes
presentes na quinoa são neutralizados desta forma.
Uma palavra sobre o
milho…
Receitas
tradicionais sugerem deixar o milho ou a farinha de milho de molho em uma
solução saturada de hidróxido de cálcio (Ca(OH)2). Isso livera
nicotinamida (vitamina B3), que de outra forma fica retina no grão. Deixar o
milho de molho também melhora a qualidade geral do milho. Se você consmoe
produtos à base de milho usualmente, o cuidado de deixar de molho na solução de
hidróxido de cálcioajuda muito a evitar a deficiência de vitamina B3 no
organismo, que tem sintomas desagradáveis como pele rachada, fadiga e desordens
mentais.